A menininha de uns cinco anos, toda mirrada e vestida em chuquinhas e sandália cor de rosa, viria, provavelmente, da estação Vila Prudente. Sentava-se ao lado da mãe, negra como a filha, mas gorda e de braços envoltos à criança. Já era quase meio-dia. Entre a estação Sacomã e Alto do Ipiranga a pequena disse que iria dormir e pediu à mãe que só a acordasse quando amanhecesse. Debaixo da terra, naquela escuridão em que só vemos nosso próprio reflexo na janela do frio trem da linha verde, e exíguos pontos de luz que passam em alta velocidade, a pequena encostou-se no colo da mãe. Juntou as mãozinhas nas bochechas e simulou um sono profundo. O percurso mal chegou até a Santos-Imigrantes e a menina já brandia, quando o túnel lá em baixo começava a dar sinais de que a escuridão iria acabar, elevando-se. "Amanheceu!", disse ela, olhando para a Ricardo Jafet e a podridão do rio Ipiranga. Vibrou, gritou, bateu palmas. Havia amanhecido. O trem seguiu seu rumo para a Chácara Klabin. A menina fingiu voltar a dormir, ainda feliz por ter visto o sol. Longa escuridão. Teria de esperar até a Sumaré para que amanhecesse de novo.
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3 comentários:
Quando ela crescer um pouquinho, ela vai ver que as variações não são apenas de claros e escuros, mas que há muitos elementos interessantes a serem observados. A viagem da vida é realmente ou pouco fria ou sonolenta enquanto não conseguimos ver além do os nossos próprios reflexos. O amanhecer é um despertar de consciência.
Uauuu, cheguei a pensar que era sobre um dos livros da sangria crepusculo, ainda bem que não foi.
As vezes sinto falta de ver o mundo como criança.
Eu morria de medo dos tuneis...
bjÕs!
Sensacional!
Adorei *-*
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