quarta-feira

Música do silêncio

John Cage foi um compositor experimentalista norte-americano nascido em 1912 que tornou-se conhecido pelo silêncio. Parece contraditório para um músico, não? Pois bem: em 1952, compôs 4'33" (quatro minutos e trinta e três segundos), uma eminente composição dividida em três partes, feita para ser tocada em qualquer instrumento musical e, acredite, nenhuma nota! Seria uma música do silêncio? Vamos ver...


O que ouviram? 

Vou começar dizendo o que eu ouvi. Em ordem de aparição: o tiquetaquear de meu relógio de pulso; o pingar da chuva na calha; o roncar de minha barriga esfomeada; o ir e vir de minha respiração; o correr do carro na rua; o tossir de alguém (por que as pessoas tossem tanto?); o bater violento da porta do vizinho; o gritar insistente rua por alguém que não responde; o "creck" do estalar de meu pescoço; o cochicho ocultado de algum segredo; o tilintar de panelas do primeiro andar. 

Ao longo desses quatro minutos e trinta e três segundos, tudo ficou claro (e ruidoso): não era silêncio o que eu tinha. Era como se eu tornasse o meu mundo sonoro em estético, e a arte está aí. Tudo começou a se tornar musical, até os sons mais banais do cotidiano, como o barulho da rua e do meu corpo. O mundo bruto, afinal, transformou-se em arte. E nós próprios é que fazemos parte dessa obra-prima. 

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