quinta-feira

Confessionário

São Paulo, eu pequei, mas peço seu perdão. Agi mal e desobedeci a principal norma da cidade: saí de casa sem blusa e guarda-chuva dentro da bolsa.

Sei da imprevisibilidade de seu tempo, Sampa. E mesmo assim, mesmo sabendo dos riscos do acaso dessa selva de pedras, insisti e errei, por pura preguiça de carregar mais peso na bolsa. E paguei, São Paulo, paguei o preço de uma tempestade que começou quando eu estava no meio da rua, sem qualquer telhado ou abrigo, seguida de um vento frio que fez a temperatura cair drasticamente de noite. Senti frio, SP, fiquei encharcada e peguei uma gripe daquelas. Mas nunca mais farei isso, eu juro. Pequei, Sampa, pequei, mas preciso do seu perdão. 

Há ainda outras perversidades que cometi ao longo do ano, menores, mas igualmente contrárias às leis e à moral - sim, mesmo sabendo, São Paulo, que não existe "pecadão" ou "pecadinho": peguei a Marginal em véspera de feriado e não reclamei uma vez sequer do trânsito ou da poluição. Andei de metrô na Sé às 18h para voltar para casa e não praguejei as pessoas e o transporte público superlotado da cidade. Deixei de comer pastel de feira e dei para falar todos os plurais.  Não me comportei como uma paulistana de verdade. Pequei, Sampa, eu sei que pequei, meu. 

Semana passada, ouvi bossa e tive vontade de ter casa com vista pro mar. Até sinto vergonha por lembrar! Não incluí cuscuz paulista no cardápio; deixei que os moradores de outros Estados falassem mal de sua garoa; não me emocionei ao andar pelo seu centro histórico num dia nublado. Pequei! Mas estou arrependida! Estou realmente arrependida, São Paulo! 

Em sinal de meu arrependimento, prometo cantar Sampa cem vezes seguidas. Prometo comer uma pizza por noite, durante um mês. Prometo reforçar meu sotaque do Bixiga quando estiver fora. Prometo nunca mais esquecer a blusa e o guarda-chuva. Eu prometo, Sampa. 

Me perdoe. 

Um comentário:

mary disse...

Achei muito engraçado!!! Vc acertou em cheio! Beijinho