quinta-feira

Os dois lados da mesma moeda

Algum lugar de São Paulo, quatro de fevereiro de 2009.
Por volta das 13h. Fila da Lotérica.

Com o objetivo de ganhar alguns milhões de reais, envolta àquele sol a pino de horário de verão que derrete peles desprotegidas, uma menina aterrizou a caneta sobre a sorte e pintou alguns números que tem afinidade. O que faria com o dinheiro do prêmio?
Esta menina de quem falo a você, até tinha nome; mas isso não é o mais importante agora. O que realmente importa é que ela era a segunda de uma das duas filas dos dois caixas do estabelecimento. O primeiro de uma das filas, um homem que reclamava sobre a utilidade de seu cartão, foi logo atendido. E só sobraram duas coisas: a menina e uma multidão trás dela. No caixa ao lado, que ficava mais próximo da saída, chegou a vez de uma mulher, adulta com seus cinquenta e poucos anos. Era a vez dela, mas alguém passou em sua frente; alguém que, por lei, tem direito de agir dessa maneira: um senhor idoso que portava um calhamaço de jogos a serem feitos e conferidos. "Nossa, quanta coisa!", disse a cinquentona que perdeu o lugar no guichê, referindo-se a quantidade de jogos que o senhor portava nas mãos. "É, pois é, mas a senhora está com pressa? Não, ? Vai ter que esperar... Tem que ter paciência". A mulher, sem graça, porém respeitosa, aceitou sem problemas... Até chegar um terceiro, um homem que fazia parte da multidão atrás da menina: "É, paciência a gente tem, mas...". "Mas o quê?", retrucou o idoso... "Eu estou nos meus direitos; isso é lei!". A menina foi atendida; retirou seu prêmio de dois reais e, com o dinheiro, fez um jogo. Ela ficou entretida com a atendente durante menos de um minuto. Hora de sair, menina! Mas a discussão a deixou ali, de espectadora da palhaçada ao vivo. E a um terceiro intrometido acrescentou-se um quarto, um quinto, um sexto, a lotérica inteira; e o último som cortado pela boca do idoso, até a permanência da menina, foi: "Eu vou chamar a polícia!". “Pode chamar!”... "Calma minha gente...!".
E a menina, com um pouco de pressa, foi até o ponto de ônibus, à procura de um pouco de sombra enquanto esperava seu transporte. Não deu para sentar, mas deu para ficar sem a estadia perturbadora do sol e, de quebra, receber um ventinho bom. Ao seu lado, estava um casal de idosos, sentados, dividindo um saco de pipocas. De quando em quando, o senhor levantava e dava um pouco de pipoca a um cachorro que estava sentado mais a frente. Mais tarde, um amigo do casal chegou; "oh compadre, você por aqui!", dirigindo-se ao casal. "Pois é compadre, eu estou aqui com a minha namorada!". Papo vem, papo vai, agora a menina era espectadora de uma conversa de um rumo completamente diferente. "É, mas hoje em dia é tudo muito diferente. A filha de um colega da corporativa mesmo, largou o marido com três meses de casamento", disse o amigo. "Ah, mas hoje é assim mesmo... Nossa filha tá com 57 anos e nós estamos juntos há 58 anos". "Nossa, mas isso é muito difícil! Eu estou há 43 com o meu", disse uma senhora que estava por perto". E assim, a conversa a três, ficou a quatro, a cinco, ao ponto inteiro. “É, porque depois morreu, morreu, não é mesmo?”, disse um senhor. "E a gente namora até hoje, viu! Ele me leva para passear”, disse a namorada mais feliz daquela tarde. O ônibus da menina chegou.
Agora eu pergunto: como será que é melhor aproveitar os seus direitos? Brigando por um lugar na fila ou vivendo a vida de aposentado sem pressa, ao lado da namorada?

5 comentários:

José Anderson disse...

[silver] As coisas eram diferentes...

O direito de ser feliz é o melhor para ser buscado, mesmo que exija brigas e lutas... =ºD

Só não acho justo chegar aos sei lá quantos anos e não ter o merecido descanço...
(conheço varios casos)

Ficou bom o texto Meu Bi...
Consegui imaginar as cenas...


bjÕs

p.s: Orri gisepi osi veco?
O i levadido osi orri?

José Anderson disse...

[silver] altGr+ "+=§" que fica do lado do backspace...


igual a "§"

Camilla Wootton Villela disse...

Concordo! Sou plenamente a favor do merecido descanso. E todas as regalias que os idosos têm, ao meu ver, são merecidíssimas. O que muda é o jeito que são encaradas;

ju. disse...

Ahhh
olha o texto dos velhinhos xD

gostei Caa, ficou mto bom ^^
vc inventou ou se baseou em algo q vivenciou?
a menina da lotérica é vc?hauhaua
pq eu imaginei as cenas como vc sendo ela...

hm.eu gosto d gnte idosa...mas sou meio suspeita p falar tb..

mas sempre existem aqueles folgados sem noção =P
Depois d tantos anos nao aprenderam a ser educados.E não será nessa altura do campeonato que conseguirão ser...

Hehe..porém cabe ressaltar q sao poucos^^...pelo menos os q conheço huahau
No geral eles sao uns fofos e as histórias sao as melhores =D

ahhh manaa...saudades desde ja
bjones

Anônimo disse...

Ah, meu... que texto maravilhoso!

Dava pra se colocar no lugar da "menina", protagonista da crônica...
Sempre quis ter tanta criatividade quanto você, mas me contento com o que tenho.

Também nunca pude ler suas redações na escola (salvo alguns que o prof. Panda obrigava-nos a ler em público =p), mesmo que ficasse a todo instante admirando as dezenas de linhas que eram construídas uma a uma e sempre tendo correlação com o assunto a ser desenvolvido.
Agora posso ter certeza que você nasceu pra ter o papel de comunicadora, tanto sendo como jornalista, escritora, quadrinhista ou cronista, tanto faz; esse é o seu lugar.

Mais uma vez, a-do-rei seu texto!

E sobre o conteúdo do texto, não importa qual a idade, sempre haverão os finos e os ignorantes, os sábios e os tolos. Cada um é aquilo que foi criado pra ser.

Baci, bella bambina xD